Enfim o dia amanhecia depois de uma longa noite inquietante. Pairava entre os ocupantes do navio de bandeira espanhola Constelación, um clima de tensão e temor de a qualquer momento uma tormenta quebrasse o mar com ondas de mais de quatro metros. Embora acostumados com situações de extremo perigo, ainda assim, temiam pela segurança da valiosa carga de especiarias que transportavam das Índias.
No céu ensurdecedores trovões ecoavam manifestando o seu poder,
seguidos de horrendos raios cortantes que riscavam a escuridão do céu,
desenhando a imagem do pavor. No horizonte um denso nevoeiro não escondia a soturna
realidade. Ainda assim, a embarcação cumpria o seu destino, navegando cautelosa
nas proximidades da costa africana a oeste das Ilhas Canárias.
Algo semelhante havia acontecido tempos atrás, quando Constelación
e sua tripulação enfrentaram um iminente naufrágio. A fúria das águas chegaram a
lavar o convés fazendo da embarcação um brinquedo de criança. Enquanto isto
seus ocupantes agarravam-se aos seus credos com fé.
Mesmo com todo esse clima perverso causado pela natureza arredia e
descontente, a tripulação se sentia mais segura a ter que enfrentar a perigosa
nau capitaneada pelo capitão Moribundo, nome atribuído a Charles Grahann,
temido pirata, o qual tinha o Atlântico como o seu principal reduto de ação e
pilhagens. Eram conscientes que, se o enfrentassem, a situação seria vencer ou
morrer, sem a mínima possibilidade de contar somente com a sorte, mas sim, com a
habilidade de cada um, e o derramamento de sangue inevitável.
O grande e pesado galeão espanhol Constelación navegava lento em
direção ao Mediterrâneo. Algumas milhas adiante, Tigre Veloz o aguardava impune
de qualquer suspeita próximo a Gibraltar. No momento oportuno bastava arriar a
bandeira francesa da qual usava como escudo, para de imediato hastear a temida
bandeira com a imagem estampada do Tigre Dourado, transformando-se no terror
dos mares.
Infiltrado entre a tripulação do galeão espanhol, um fiel espião tinha
a missão de facilitar toda a ação da embarcação pirata. Para tanto, provocaria
um premeditado incêndio no tombadilho, lugar ideal e de fácil propagação das
chamas, também ideal para emissão de sinal. A carga muito ambicionada de valor
inestimável, da qual pretendiam subtrair os permitiria desaparecer por algum
tempo, escondendo-se nas Antilhas em uma das centenas de ilhas do arquipélago
das Bahamas.
Enquanto o tombadilho ardia em chamas e a tripulação envolvida em
deter o fogo, eis que surge lado a lado do galeão como um fantasma, Tigre
Veloz. A surpresa foi tamanha que a rendição aconteceu sem violência e ter que efetuar sequer um disparo. Os próprios piratas ajudaram a conter
as chamas e garantir a segurança da carga motivo do ataque.
Após o vitorioso saque, capitão Moribundo representado pelo seu
imediato, o Espantalho, liberou a embarcação e sua tripulação, para em seguida
desaparecer mar adentro, com destino ao Mar das Caraíbas. Capitão Moribundo
reuniu os seus valentes companheiros e expôs o seu plano de imediato:
– Companheiros amigos! – Disse em voz firme e alta.
Esta nossa conquista de hoje será a última, pelo menos por
enquanto, nestas imediações.
Estamos sendo muito constantes por aqui. Com o resultado deste
saque temos mais que o suficiente para ficarmos fora de ação por algum tempo.
Estou convencido e decidido de que devemos seguir para o Mar do
Caribe. Temos informações que vultosos tesouros são transportados de lá com
destino à Espanha e à França. Podemos ganhar muito mais, depois deixaremos de
sermos notícias por uns tempos.
Para nossa segurança, estaremos distantes, navegando numa área
considerada sem domínio, o que tornará nossas ações menos declaradas. Se
tivermos sorte, podemos construir um grande império financeiro.
Temos uma meta, da qual não podemos nos afastar. É uma questão de
honra, arriscar para defender nossa própria integridade de homens de bem. Pelo
menos é o que éramos até sermos acusados e sentenciados injustamente pelo que
não somos os responsáveis! – Não foi preciso dizer mais nada, sendo imediatamente apoiado por todos.
Uma vez acertados os detalhes partiram dali mesmo em direção dos
seus ideais, como homens em busca da glória e da fortuna. Como homens destemidos,
capazes de morrer se preciso, em busca de resultados que os facilitassem, provar
suas inocências ultrajadas pela ganância e pela ambição da maldade escondida
sob o manto da impunidade.
No ano de 1698, imponente navio ostentando magnífica bandeira
inglesa, navegava retornando pra casa, quando foi surpreendido nas proximidades
do Canal da Mancha, por outro navio também de bandeira inglesa, que Charles
Grahann o conhecia muito bem. Seu comandante capitão Johnny Flampper era um
respeitado corsário inglês, responsável por inúmeras façanhas bem-sucedidas.
Na época a Inglaterra e a França haviam acabado de resolver algumas pendengas
que resultaram em perdas para ambos os lados. Não bastasse, a Inglaterra começou a enfrentar seríssimos problemas de questões internas. A Revolução Gloriosa que acabara de ocorrer estabelecia o fim do absolutismo inglês e proclamava o Parlamentarismo.
Distante das formalidades políticas que aconteciam no império
britânico, Charles Grahann, comandava sua tripulação a bordo do seu navio nas
suas habituais viagens comerciais. De repente notou a aproximação inesperada de
outro navio ostentando a bandeira inglesa. Embora sendo uma embarcação conterrânea,
manteve-se cauteloso poderia ser na verdade, uma embarcação pirata disfarçada pelo brasão
inglês. Ainda assim, arriou as velas para em caso de um confronto inevitável,
não correr o risco de perder os seus mastros.
Entretanto, sua aparente tranquilidade não durou muito, quando é
informado pelo observador posicionado no alto do mastro principal, o qual viu
através da sua luneta Johnny Flampper dar ordens para atacar. Imediatamente
Charles Grahann colocou sua tripulação em alerta, pronta para responder ao ataque com
força total sem piedade. Assim que o seu inesperado oponente iniciou sua
manobra para posicionar os seus canhões, ficou declarada a intenção. Agora
seria só aguardar o adversário efetuar o primeiro disparo e estaria
estabelecido o combate.
Enquanto os homens corriam de um lado para o outro procurando se
proteger e contrata atacar, Charles Grahann começou analisar a situação
procurando resposta para aquele ataque despropositado. Concluiu que a atitude
Flampper só poderia ser ordens de alguém influente da alta corte comercial inglesa que o querida morto. Pelo que
conhecia do seu adversário, não comportaria daquela forma deliberada sem
motivos. Ainda mais em se tratando de um navio com a mesma bandeira, dificilmente sairia
daquela situação impune das leis marítimas.
Com fúria, rapidamente também emitiu ordens para sua tripulação se
posicionar adequadamente que seriam atacados. Uma batalha sem precedentes foi
declarada entre as duas forças. Entretanto, com a destreza de exímio espadachim
e certeiro atirador com suas armas, Charles Grahann só esperou o primeiro
disparo e partiu para o revide. Para surpresa de Johnny Flampper que imaginava
o valente Grahann desguarnecido e despreparado, presenciou uma batalha, da qual preferia não
tem aceitado a missão.
Utilizando-se de muita astúcia, Charles Grahann enfrentou Johnny e
seus asseclas. Depois de sangrento embate saiu-se vitorioso. Ainda que, ferido
nas costas por um tiro de mosquete que o fazia sangrar muito, não o impediu de
lutar até ao final. Como era jovem e forte suportou a dor, a fraqueza e a febre
até ser levado ao litoral português e ser atendido por uma senhora que se
prontificou ajudá-lo. A atenciosa senhora, desconhecendo o
seu nome, mesmo porque se encontrava bastante enfermo e, nos seus momentos de
delírio pronunciar palavras desentendidas, começou a chamá-lo
de jovem moribundo. Apelido que veio substituir sua verdadeira identidade,
transformando-se uma incógnita para aqueles que não o conhecia e lendário para
aqueles que o confrontaram.
Daí Charles Grahann, passou a ser conhecido como capitão
Moribundo, tanto em homenagem à obstinada e cuidadosa senhora portuguesa,
quanto pela simpatia que o nome causava.
Emblemático para a saga de um dos mais destemidos transgressores do
Atlântico, no comando da tripulação do navio que passou a ser denominado de
Tigre Veloz o impiedoso. E assim, a temível estampa do tigre dourado, animal
que Grahann passou a admirar através das suas viagens às Índias, tornou-se sinônimo
de bravura e terror.
Tigre Veloz, seu navio agora de várias bandeiras, artimanha
utilizada para confundir suas presas era velos e imbatível. Com facilidade desaparecia
no horizonte sem deixar rastros. Pela sua capacidade diabólica de evaporar após
um bem-sucedido saque, e a sagacidade de um expert em traçar planos ousados, já havia ganhado destaque e temor para qualquer navegante.
Levava a bordo além de homens corajosos, 28 canhões escondidos por
escotilhas que não deixavam quaisquer indícios e vestígios de suspeitas. Para
todos que o viam não passava de um navio de passageiros. Por isto eles próprios
o chamavam de navio camaleão. Quando atracava sua tripulação transitava pelas
cidades livres e incólumes. E o seu comandante podia frequentar com
naturalidade altas rodas sociais, como um elegante e bem-sucedido fidalgo de
origem e descendência desconhecidas.
Por meio da astúcia de Charles Grahann, a esperteza e a camuflagem sob as
vestes de elegantes senhores que, tanto o capitão Moribundo, quanto a sua tripulação conseguiam importantes informações, para arquitetar suas ações com antecedência. Tempo suficiente para um
planejamento eficiente de suas atitudes e privilegiada competência, raramente perdiam uma nova empreitada.
Grahann antes de se tornar homem do mar era uma pessoa comum, filho
de uma bem estruturada família inglesa. Talvez seu fascínio pelo mar se devesse
pelos inúmeros livros que havia lido no decorrer de sua juventude. Por
determinação e cuidados dos pais, estudou sob a batuta de nobres professores em
ricas e importantes escolas do reino. Dedicou-se com afinco em todas as
disciplinas e assuntos diversos relacionados ao empreendedorismo, sobretudo, fluência em idiomas, história, filosofia e astronomia.
Havia lido autores importantes, os quais lapidaram os seus
conhecimentos permitindo-o, comportar com desenvoltura e distinta elegância em
qualquer situação. Com a idade de 30 anos, porte físico forte, esbelto era um
exemplo de beleza, simpatia e sedutor contumaz. Capaz de impressionar as mais
exigentes damas.
Acontecimentos involuntários e imprevistos às vezes determinados
pelo acaso são capazes de mudar a postura de uma pessoa levando-a a trilhar
caminhos antes não imaginados. Foi o caso do capitão Moribundo, ou capitão
Charles Grahann. Antes, fazia parte de seus ideais, a exemplo do seu pai, ser
um homem primado pela retidão, pela honra e a disciplina de um bom patriota.
Totalmente ao contrário do homem que havia se tornado, um transgressor.
Até então, era um jovem e destemido corsário a serviço da coroa inglesa. Após
ser traído de forma ardilosa, covarde e vergonhosa. Da qual lhe foi imputando crimes
deploráveis de roubo contra o patrimônio econômico do seu país e assassinatos
com requintes de crueldades sem merecimento, o obrigou dar um inesperado rumo para sua vida. Deixar para trás, ambicionados projetos de ser um grande empreendedor internacional, para se tornar no pirata mais
temível e procurado em todo o Atlântico.
Como consequências, temendo ser julgado e condenado por crimes não
cometidos, resolveu impor o seu próprio regime de lutar contra os mal intencionados
líderes da coroa, de forma pouco convencional. Instituiu um propósito de
construir o seu próprio império na ilegalidade, com a finalidade de obter o
necessário para financiar seus objetivos de vingança e resgatar o honrado nome de sua família. Além é claro, de mostrar o seu
poder de domínio sobre qualquer potência marítima da sua época. Independente da
cor ou do desenho do brasão estampado na bandeira de suas vítimas.
Capitão Moribundo também usava como estratégia esconder-se por trás da figura de um de seus
marinheiros e amigo de batalhas Gaborow, o Espantalho. Senhor surdo com
aproximadamente 45 anos, aparência desgastada pelas brabezas do tempo, olhar
firme e frio; sobrancelhas espessas transmitia a impressão de um homem
implacável, reforçada por uma longa barba grisalha. Aparência com a qual
permitia o seu comandante fora-da-lei se mantivesse no anonimato perante
aqueles que não o conhecia.
Como Espantalho não podia se expressar através de palavras, seus gestou
rústicos próprios do estereótipo de uma medonha e desalmada criatura com poucas
características humanas, aqueles que o viam pela primeira vez, tinham a
impressão de estar mais próximo de um assustador e intrépido espantalho. Com
aparência asquerosa, era comum vê-lo usando um grande chapéu semelhante aos da
corte francesa, destacando um grande penacho vermelho carmim na extremidade
lateral de uma das largas abas.
Em breve a continuação desta intrigante história de ação e
aventura. Muitos acontecimentos envolvendo coragem e emoção estará por vir. Não
deixe de conferir.
Imagens: Internet.
Um comentário:
Muita criatividade. Desejo muito sucesso!
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