Na parte anterior você viu o perfil
de Charles Grahann, a forma e os motivos através dos quais o fizeram se
transformar no temível pirata capitão Moribundo. Agora verá sua trajetória de “bucaneiro” determinado em arquitetar o seu plano de se aproximar dos seus
devedores e vinga-los sem piedade.
Após o saque
ao Galeão Constelación, quem via Tigre Veloz singrando o mar calmamente
amparado pela bandeira portuguesa, imaginaria de imediato tratar-se de ricas
personalidades em viagem rumo a algum lugar majestoso, quem sabe até à corte
brasileira.
Todos
vestidos a caráter para não deixar qualquer dúvida e, também, para se
protegerem de eventuais navios de combate a serviço da coroa inglesa ou
francesa, cujos interesses particulares eram contrários à pirataria no
Atlântico.
Para essas
ocasiões de esplendor e garbo, se destacava à frente no comando, Charles
Grahann elegantemente vestido com sua túnica branca, com os lindos botões
dourados e o seu belo boné de capitão, desenhado com lustrosos detalhes também
em dourado, navegando no hemisfério sul, logo abaixo a linha do equador.
Era tardinha
quando o vigilante do alto do seu observatório avistou ao longe outro navio de
aparência suspeita dirigindo-se em sua direção. Imediatamente, Charles Grahann
deu suas ordens de manterem-se calmos como inofensivos passageiros. Também
orientou os canhoneiros para se posicionarem e no momento oportuno tornarem
visíveis as escotilhas e abrirem fogo sem chances de revide.
Quando o
navio inimigo se posicionou a estibordo da nau comandada pelo astuto bucaneiro
Charles Grahann, o qual naquela época, já ostentava larga experiência em
combates. Ao se certificarem tratar-se de outra embarcação pirata, confiante de
presa fácil, surpreendeu-os com uma saraivada de tiros efetuados por 14
infalíveis canhões. Sem hesitar Tigre Veloz de indefeso veleiro, se transformou
num cruel dragão raivoso cuspindo o fogo da desgraça em direção à
embarcação aventureira.
Antes de ir
a pique, os desavisados sobreviventes inimigos ainda tiveram tempo suficiente
para se atirarem ao mar, deixando a embarcação disponível para que os homens do
capitão Moribundo recolhessem suas armas e munições, as quais viriam servir
para abastecer e ampliar o seu arsenal de guerra.
A intenção
não era deixar sobreviventes, mas valia o direito do salve-se quem puder.
Sempre que ocorria um embate com resultados favoráveis e sem baixas, capitão
Moribundo vestido como o elegante Charles Grahann e aprendiz de astrônomo
cercado das inevitáveis superstições, acreditava que no momento das abordagens
os astros estavam alinhados a seu favor. Também como curioso vigilante
interessado em astronomia, gostava de se orientar pelas estrelas nas suas
navegações noturnas, ocasião na qual ficava horas contemplando o espaço com um
pequeno telescópio a bordo.
Novamente
Tigre Veloz seguiu seu rumo mar adentro, saboreando o ar do verão e a sensação
de liberdade. Confiante de que não teria nenhum transtorno pela frente, aproximou-se
da costa caribenha, serenando nas águas rasas, mornas e azuladas do Mar das
Antilhas.
Baixaram as
velas mantendo-se suavemente à deriva, atentos ao posicionamento da bússola e
das cartas náuticas. A intenção era aportar na Ilha de New Providence, de onde
ouvira contar várias histórias de piratas e suas notáveis aventuras de saques
milionários em riquezas provindas do continente. Antes de ancorar especificou
detalhadamente como seu pessoal deveria se comportar, enquanto ele, e uns
poucos permaneceriam a bordo.
Para aqueles
que iram aportar em terra firma, Charles Grahann transmitiu-lhes as seguintes
ordens:
– Quando chegarmos
à ilha procurem andar em grupos menores;
–
Comportem-se como pessoas ricas com destino ao Brasil na intenção de adquirir terras.
Levem bastante moedas de ouro;
– Conversem pouco e ouçam mais. Deixam transparecer que suas passagens pela ilha ocorreram devido a erro nos cálculos de navegação, e que logo pretendiam retomar a viagem com o destino certo. Dessa forma atrairão a atenção dos faras-da-lei, e assim, chegaremos aos seus chefes, ou comandante. – Esclareceu Grahann.
A partir dos
esclarecimentos apontados, deixou por conta de cada um. Não haveria de dar
errado, eram homens experientes e sabiam se comportar como tal.
Não demorou
muito o plano começou a surtir efeito, quando um dos grupos conseguiu fazer
prisioneiros quatro elementos mal-intencionados que haviam tentado roubar-lhes.
Como não
estavam lidando com amadores, foram facilmente dominados, sendo logo levados à
presença do capitão que já os aguardavam em lugar seguro, fora do navio.
Forçados a
falar contaram tudo o que queriam saber, e foram logo liberados confiantes de
que imediatamente o seu comandante tomaria conhecimento sobre os fatos. E, com
isto seria fácil ser capturado. O plano não era matá-lo, mas sim, se informar
das forças repressoras existentes naquelas áreas e, também, quem dominava
aquelas águas e ilhas para eles até então desconhecidas.
Através do astucioso plano, Charles Grahann, foi informado que Henry Morgan antigo corsário inglês, havia enveredado para o mundo dos infratores, com um diferencial: tornara-se importante pirata na região, após o seu ataque à cidade do Panamá em 1670, e posteriormente ter se transformado em vice-governador de Port Royal na Jamaica, além de rico dono de plantações de canas-de-açúcar.
Sem tomar
conhecimento da importância do seu rival naquelas águas, soubera impor suas
condições de audaciosos e temidos homens do mar. Entretanto, após cinco anos de
inesquecíveis aventuras e se tornado rico juntamente com seus marinheiros e
elegantes marginais, resolveu retornar à Europa.
Antes da
partida fez uma cuidadosa reforma no Tigre Veloz, ampliando suas condições de
acomodações e outros requintes internos, com a finalidade de tornar-se útil
tanto quanto navio de combate e pirataria, como de uma luxuosa embarcação de
cruzeiro.
Transformando-se
num perigoso camaleão de luxo e de ataques precisos. Em sua primeira parada no
litoral em território europeu, fez questão de instalar no seu camarote,
importantes e modernos instrumentos de comando marítimo, só possíveis para quem
possuía muito dinheiro, detalhe que para ele não fazia mais a diferença. O seu
objetivo estava traçado e pensado, retornar à sua terra de natal e realizar as
reparações que pesavam sobre si e seus companheiros.
Além de muito
rico, sua imagem estava totalmente renovada. Os resquícios que ainda poderiam
existir dos tempos em que era comandante pirata na área, haviam ficado para
trás e o que importava daquele momento pra frente, seria concretizar sua
vingança provando a inocência de todos eles.
Esclarecer
as acusações de que foram vítimas pela armação engendrada com intenções maldosas
de torná-los bodes expiatórios pelas pilhagens praticadas por ricas autoridades
inglesas, dentre as quais George Lemmon, importante figura na Administração
Comercial do Rei, principal beneficiado e inescrupuloso arquiteto do seu
infortúnio e dos seus leais companheiros.
Nesse
período em que esteve longe dos acontecimentos em torno do reino inglês e,
também, dos ataques e saques impetrados por piratas na costa europeia e
africana, imaginou-se esquecido pelas autoridades que atuavam contra a
pirataria infringente, ou até mesmo, ser considerado como morto.
Como
gratificação, depois de tanto tempo ausente dos limites europeus, foi o
suficiente para construir o seu próprio império econômico, contabilizando
muitas riquezas em ouro e pedras preciosas, oriundas das terras em fase de
dominação e colonização pelos espanhóis.
Espantalho
havia se transformado num mito do alto-mar, graças a sabedoria do seu
comandante e sua aparência convenhamos, nada atraente. Dentre as batalhas
travadas por eles, duas mereceram destaque. A primeira quando Tigre Veloz
interceptou um Galeão Espanhol, desconhecendo naquele interim, a escolta que o
acompanhava algumas milhas atrás.
Quando tudo
parecia resolvido e os piratas do capitão Moribundo comemoravam, foram surpreendidos
por alguns tiros de canhões, os quais, por pouco, teriam acertado em cheio sua
embarcação. Após a surpresa, utilizando-se de calma e perícia, capitão
Moribundo, ajudado por outros quatro companheiros que continuavam a bordo do
Tigre Veloz, fez da embarcação saqueada de escudo. E, com extrema habilidade de
uma raposa do mar, surgiu inesperadamente a bombordo sorrateiro e infalível.
Só precisou disparar quatro tiros certeiros de canhões no navio escolta para desativar todas as defesas do oponente, deixando a conclusão da missão por conta dos seus bem treinados e inflexíveis soldados piratas. O confronto deixou o cenário da imensidão marítima em um amontoado de destroços fumegantes.
Outra ocasião de destaque, foi no momento em que estavam ancorados na Ilha dos Mascates, próximo da gruta Fossor, quando receberam a visita indesejada do também pirata Henry Avery, outro ambicioso adversário em seu caminho.
Acontece que
Henry Avery, havia planejado saquear o Galeão Espanhol, no entanto, os seus
planos haviam naufragados com a antecipação ocasional praticada pelo capitão
Moribundo. A partir daí, ficou estabelecido que Moribundo e os seus
companheiros deveriam pagar pela ousadia.
O erro de
Henry Avery, foi imaginar que a tripulação do Tigre Veloz, mesmo com a
embarcação ancorada em terra firme, estava entretida comemorando o seu rico e
triunfante saque. Esqueceram que o sempre atento, capitão Moribundo, com sua
astúcia implacável percebeu algo estranho no cais e, alertou os seus
comandados, para o perigo eminente, sem deixar transparecer que estavam prontos
para o que der e vier.
Capitão Moribundo
e os seus treinados companheiros, encaram com coragem a luta, deixando Henry e
os seus séquitos embasbacados, surpresos e sem saída. Podia-se ouvir o tilintar
das espadas e a agilidade dos saltos felinos praticados pelos dois oponentes,
esquivando-se dos golpes brutais das lâminas afiadas.
Havia sangue
no canto da boca e nos dentes de Henry Avery, provocado pelo soco certeiro
empunhando a espada do capitão Moribundo, que atingiu o seu maxilar durante um
instante de vacilo.
A violência
da pancada com o punho da mão esquerda agarrada ao cabo da espada
transformou-se num duplo impacto. Capitão Moribundo era canhoto, o que tornava
ainda mais difícil antecipar seus movimentos. Enquanto isto os demais lutavam
impondo todas suas destrezas mortais.
Ocasião na qual
ocorreu uma das mais sangrentas colisões de forças experientes, quando henry
ficou mortalmente ferido pela espada cortante de Moribundo, revelando mais uma
vez suas habilidades com as armas, principalmente com a espada e a adaga.
Agora em
terras europeias sob o manto da retidão de um respeitado cidadão, o seu objetivo
seria colher o maior número de informações sobre o que estava acontecendo na
corte inglesa sem deixar suspeitas. Charles Grahann resolveu primeiro se
instalar provisoriamente na França.
Neste país
ele sabia que, uma vez infiltrado no alto escalão social, saberia como adquirir
as informações necessárias para dar curso aos seus propósitos. Assumindo a
identidade de um escritor irlandês, iria frequentar as altas rodas da cultura e
da sociedade imperial. Em companhia de ilustres personalidades, foi colhendo
dados importantes que lhe serviriam para arquitetar o seu plano.
Época em que
ficou conhecendo Jacques Villefronsiér, rico empreendedor no setor de
perfumaria. Não poderia ter uma parceria melhor e mais oportuna. Através de
Jacques, Charles Grahann sempre bem acompanhado das mais importantes figuras da
corte francesa, especializou-se em fragrâncias e nos processos de
industrialização de perfumes e derivados.
Sua ideia
inicial seria se especializar em vinicultura, assim penetraria com mais
facilidade na nobreza inglesa grande apreciadora de vinhos. Contudo, a sorte
acompanha aquele que persiste na busca por evidências importantes para o
desenrolar do seu propósito, e de quem não tem medo de encarar as
controvertidas situações. E o setor de perfumaria estaria de bom tamanho, mesmo
porque as damas inglesas pela sua inegável vaidade, davam grande valor à
perfumaria francesa.
Com os
conhecimentos adquiridos e consolidando virtuosas parceria através do
emprego de significativa quantia em recursos financeiros, idealizou abrir uma
filial francesa de perfumaria no seu país.
O sucesso foi
imediato e robusto. Com outra identidade, agora como Claude Fontaine,
propositadamente criado para não revelar sua verdadeira cidadania, partiu com
destino à Londres com o seu plano de vingança pré-estabelecido.
Lógico que
faltava superar fases que deveriam ser respeitadas com extremo cuidado, para
enfim, entrar no cerne da sociedade inglesa. Mesmo com a identidade de um importante
investidor no setor de essências aromáticas, algo mais seria indispensável
acrescentar. Mas não desistiria, os episódios seguintes, ainda que difíceis e
tratados com a devida cautela, seriam superados de forma naturalmente,
perspicácia é o que não lhe faltava.
OBS.: Acompanhe
em breve, a última parte deste conto, o qual não deixa de ser uma aventura para
cada leitor. Obrigado pela atenção.
Imagens: Internet, Fotosearch
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