quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Valentes e destemidos homens do mar – Primeira Parte



Enfim o dia amanhecia depois de uma longa noite inquietante. Pairava entre os ocupantes do navio de bandeira espanhola Constelación, um clima de tensão e temor de a qualquer momento uma tormenta quebrasse o mar com ondas de mais de quatro metros. Embora acostumados com situações de extremo perigo, ainda assim, temiam pela segurança da valiosa carga de especiarias que transportavam das Índias. 

No céu ensurdecedores trovões ecoavam manifestando o seu poder, seguidos de horrendos raios cortantes que riscavam a escuridão do céu, desenhando a imagem do pavor. No horizonte um denso nevoeiro não escondia a soturna realidade. Ainda assim, a embarcação cumpria o seu destino, navegando cautelosa nas proximidades da costa africana a oeste das Ilhas Canárias.

Algo semelhante havia acontecido tempos atrás, quando Constelación e sua tripulação enfrentaram um iminente naufrágio. A fúria das águas chegaram a lavar o convés fazendo da embarcação um brinquedo de criança. Enquanto isto seus ocupantes agarravam-se aos seus credos com fé.

Mesmo com todo esse clima perverso causado pela natureza arredia e descontente, a tripulação se sentia mais segura a ter que enfrentar a perigosa nau capitaneada pelo capitão Moribundo, nome atribuído a Charles Grahann, temido pirata, o qual tinha o Atlântico como o seu principal reduto de ação e pilhagens. Eram conscientes que, se o enfrentassem, a situação seria vencer ou morrer, sem a mínima possibilidade de contar somente com a sorte, mas sim, com a habilidade de cada um, e o derramamento de sangue inevitável.

O grande e pesado galeão espanhol Constelación navegava lento em direção ao Mediterrâneo. Algumas milhas adiante, Tigre Veloz o aguardava impune de qualquer suspeita próximo a Gibraltar. No momento oportuno bastava arriar a bandeira francesa da qual usava como escudo, para de imediato hastear a temida bandeira com a imagem estampada do Tigre Dourado, transformando-se no terror dos mares.

Infiltrado entre a tripulação do galeão espanhol, um fiel espião tinha a missão de facilitar toda a ação da embarcação pirata. Para tanto, provocaria um premeditado incêndio no tombadilho, lugar ideal e de fácil propagação das chamas, também ideal para emissão de sinal. A carga muito ambicionada de valor inestimável, da qual pretendiam subtrair os permitiria desaparecer por algum tempo, escondendo-se nas Antilhas em uma das centenas de ilhas do arquipélago das Bahamas.

Enquanto o tombadilho ardia em chamas e a tripulação envolvida em deter o fogo, eis que surge lado a lado do galeão como um fantasma, Tigre Veloz. A surpresa foi tamanha que a rendição aconteceu sem violência e ter que efetuar sequer um disparo. Os próprios piratas ajudaram a conter as chamas e garantir a segurança da carga motivo do ataque.

Após o vitorioso saque, capitão Moribundo representado pelo seu imediato, o Espantalho, liberou a embarcação e sua tripulação, para em seguida desaparecer mar adentro, com destino ao Mar das Caraíbas. Capitão Moribundo reuniu os seus valentes companheiros e expôs o seu plano de imediato:

– Companheiros amigos! – Disse em voz firme e alta.

Esta nossa conquista de hoje será a última, pelo menos por enquanto, nestas imediações.

Estamos sendo muito constantes por aqui. Com o resultado deste saque temos mais que o suficiente para ficarmos fora de ação por algum tempo.

Estou convencido e decidido de que devemos seguir para o Mar do Caribe. Temos informações que vultosos tesouros são transportados de lá com destino à Espanha e à França. Podemos ganhar muito mais, depois deixaremos de sermos notícias por uns tempos.

Para nossa segurança, estaremos distantes, navegando numa área considerada sem domínio, o que tornará nossas ações menos declaradas. Se tivermos sorte, podemos construir um grande império financeiro.

Temos uma meta, da qual não podemos nos afastar. É uma questão de honra, arriscar para defender nossa própria integridade de homens de bem. Pelo menos é o que éramos até sermos acusados e sentenciados injustamente pelo que não somos os responsáveis! – Não foi preciso dizer mais nada, sendo imediatamente apoiado por todos.

Uma vez acertados os detalhes partiram dali mesmo em direção dos seus ideais, como homens em busca da glória e da fortuna. Como homens destemidos, capazes de morrer se preciso, em busca de resultados que os facilitassem, provar suas inocências ultrajadas pela ganância e pela ambição da maldade escondida sob o manto da impunidade.

No ano de 1698, imponente navio ostentando magnífica bandeira inglesa, navegava retornando pra casa, quando foi surpreendido nas proximidades do Canal da Mancha, por outro navio também de bandeira inglesa, que Charles Grahann o conhecia muito bem. Seu comandante capitão Johnny Flampper era um respeitado corsário inglês, responsável por inúmeras façanhas bem-sucedidas. Na época a Inglaterra e a França haviam acabado de resolver algumas pendengas que resultaram em perdas para ambos os lados. Não bastasse, a Inglaterra começou a enfrentar seríssimos problemas de questões internas. A Revolução Gloriosa que acabara de ocorrer estabelecia o fim do absolutismo inglês e proclamava o Parlamentarismo.

Distante das formalidades políticas que aconteciam no império britânico, Charles Grahann, comandava sua tripulação a bordo do seu navio nas suas habituais viagens comerciais. De repente notou a aproximação inesperada de outro navio ostentando a bandeira inglesa. Embora sendo uma embarcação conterrânea, manteve-se cauteloso poderia ser na verdade, uma embarcação pirata disfarçada pelo brasão inglês. Ainda assim, arriou as velas para em caso de um confronto inevitável, não correr o risco de perder os seus mastros.

Entretanto, sua aparente tranquilidade não durou muito, quando é informado pelo observador posicionado no alto do mastro principal, o qual viu através da sua luneta Johnny Flampper dar ordens para atacar. Imediatamente Charles Grahann colocou sua tripulação em alerta, pronta para responder ao ataque com força total sem piedade. Assim que o seu inesperado oponente iniciou sua manobra para posicionar os seus canhões, ficou declarada a intenção. Agora seria só aguardar o adversário efetuar o primeiro disparo e estaria estabelecido o combate.

Enquanto os homens corriam de um lado para o outro procurando se proteger e contrata atacar, Charles Grahann começou analisar a situação procurando resposta para aquele ataque despropositado. Concluiu que a atitude Flampper só poderia ser ordens de alguém influente da alta corte comercial inglesa que o querida morto. Pelo que conhecia do seu adversário, não comportaria daquela forma deliberada sem motivos. Ainda mais em se tratando de um navio com a mesma bandeira, dificilmente sairia daquela situação impune das leis marítimas.

Com fúria, rapidamente também emitiu ordens para sua tripulação se posicionar adequadamente que seriam atacados. Uma batalha sem precedentes foi declarada entre as duas forças. Entretanto, com a destreza de exímio espadachim e certeiro atirador com suas armas, Charles Grahann só esperou o primeiro disparo e partiu para o revide. Para surpresa de Johnny Flampper que imaginava o valente Grahann desguarnecido e despreparado, presenciou uma batalha, da qual preferia não tem aceitado a missão.

Utilizando-se de muita astúcia, Charles Grahann enfrentou Johnny e seus asseclas. Depois de sangrento embate saiu-se vitorioso. Ainda que, ferido nas costas por um tiro de mosquete que o fazia sangrar muito, não o impediu de lutar até ao final. Como era jovem e forte suportou a dor, a fraqueza e a febre até ser levado ao litoral português e ser atendido por uma senhora que se prontificou ajudá-lo.  A atenciosa senhora, desconhecendo o seu nome, mesmo porque se encontrava bastante enfermo e, nos seus momentos de delírio pronunciar palavras desentendidas, começou a chamá-lo de jovem moribundo. Apelido que veio substituir sua verdadeira identidade, transformando-se uma incógnita para aqueles que não o conhecia e lendário para aqueles que o confrontaram.

Daí Charles Grahann, passou a ser conhecido como capitão Moribundo, tanto em homenagem à obstinada e cuidadosa senhora portuguesa, quanto pela simpatia que o nome causava.  Emblemático para a saga de um dos mais destemidos transgressores do Atlântico, no comando da tripulação do navio que passou a ser denominado de Tigre Veloz o impiedoso. E assim, a temível estampa do tigre dourado, animal que Grahann passou a admirar através das suas viagens às Índias, tornou-se sinônimo de bravura e terror. 

Tigre Veloz, seu navio agora de várias bandeiras, artimanha utilizada para confundir suas presas era velos e imbatível.  Com facilidade desaparecia no horizonte sem deixar rastros. Pela sua capacidade diabólica de evaporar após um bem-sucedido saque, e a sagacidade de um expert em traçar planos ousados, já havia ganhado destaque e temor para qualquer navegante.

Levava a bordo além de homens corajosos, 28 canhões escondidos por escotilhas que não deixavam quaisquer indícios e vestígios de suspeitas. Para todos que o viam não passava de um navio de passageiros. Por isto eles próprios o chamavam de navio camaleão. Quando atracava sua tripulação transitava pelas cidades livres e incólumes. E o seu comandante podia frequentar com naturalidade altas rodas sociais, como um elegante e bem-sucedido fidalgo de origem e descendência desconhecidas.

Por meio da astúcia de Charles Grahann, a esperteza e a camuflagem sob as vestes de elegantes senhores que, tanto o capitão Moribundo, quanto a sua tripulação conseguiam importantes informações, para arquitetar suas ações com antecedência. Tempo suficiente para um planejamento eficiente de suas atitudes e privilegiada competência, raramente perdiam uma nova empreitada. 

Grahann antes de se tornar homem do mar era uma pessoa comum, filho de uma bem estruturada família inglesa. Talvez seu fascínio pelo mar se devesse pelos inúmeros livros que havia lido no decorrer de sua juventude. Por determinação e cuidados dos pais, estudou sob a batuta de nobres professores em ricas e importantes escolas do reino. Dedicou-se com afinco em todas as disciplinas e assuntos diversos relacionados ao empreendedorismo, sobretudo, fluência em idiomas, história, filosofia e astronomia.

Havia lido autores importantes, os quais lapidaram os seus conhecimentos permitindo-o, comportar com desenvoltura e distinta elegância em qualquer situação. Com a idade de 30 anos, porte físico forte, esbelto era um exemplo de beleza, simpatia e sedutor contumaz. Capaz de impressionar as mais exigentes damas.

Acontecimentos involuntários e imprevistos às vezes determinados pelo acaso são capazes de mudar a postura de uma pessoa levando-a a trilhar caminhos antes não imaginados. Foi o caso do capitão Moribundo, ou capitão Charles Grahann. Antes, fazia parte de seus ideais, a exemplo do seu pai, ser um homem primado pela retidão, pela honra e a disciplina de um bom patriota. Totalmente ao contrário do homem que havia se tornado, um transgressor.

Até então, era um jovem e destemido corsário a serviço da coroa inglesa. Após ser traído de forma ardilosa, covarde e vergonhosa. Da qual lhe foi imputando crimes deploráveis de roubo contra o patrimônio econômico do seu país e assassinatos com requintes de crueldades sem merecimento, o obrigou dar um inesperado rumo para sua vida. Deixar para trás, ambicionados projetos de ser um grande empreendedor internacional, para se tornar no pirata mais temível e procurado em todo o Atlântico.

Como consequências, temendo ser julgado e condenado por crimes não cometidos, resolveu impor o seu próprio regime de lutar contra os mal intencionados líderes da coroa, de forma pouco convencional. Instituiu um propósito de construir o seu próprio império na ilegalidade, com a finalidade de obter o necessário para financiar seus objetivos de vingança e resgatar o honrado nome de sua família. Além é claro, de mostrar o seu poder de domínio sobre qualquer potência marítima da sua época. Independente da cor ou do desenho do brasão estampado na bandeira de suas vítimas.

Capitão Moribundo também usava como estratégia esconder-se por trás da figura de um de seus marinheiros e amigo de batalhas Gaborow, o Espantalho. Senhor surdo com aproximadamente 45 anos, aparência desgastada pelas brabezas do tempo, olhar firme e frio; sobrancelhas espessas transmitia a impressão de um homem implacável, reforçada por uma longa barba grisalha. Aparência com a qual permitia o seu comandante fora-da-lei se mantivesse no anonimato perante aqueles que não o conhecia.

Como Espantalho não podia se expressar através de palavras, seus gestou rústicos próprios do estereótipo de uma medonha e desalmada criatura com poucas características humanas, aqueles que o viam pela primeira vez, tinham a impressão de estar mais próximo de um assustador e intrépido espantalho. Com aparência asquerosa, era comum vê-lo usando um grande chapéu semelhante aos da corte francesa, destacando um grande penacho vermelho carmim na extremidade lateral de uma das largas abas.

Em breve a continuação desta intrigante história de ação e aventura. Muitos acontecimentos envolvendo coragem e emoção estará por vir. Não deixe de conferir.


Imagens: Internet.



Um comentário:

BENDITO ÉS VÓS. disse...

Muita criatividade. Desejo muito sucesso!