Assim que me propus a
registrar no Bússola Literária os 10 anos da morte de Marlon Brando, conversei
com alguns amigos, principalmente do ambiente de trabalho sobre esse
controvertido, embora talentoso astro do cinema. Para minha surpresa, poucos
ouviram falar dele. Em relação aos filmes dos quais atuou, lamentavelmente
nenhum havia visto sequer, O Poderoso Chefão, tão badalado e que lhe rendeu o
seu segundo Oscar em 1973. Mesmo em se tratando de pessoas que se consideram antenadas
e conectadas, desconheciam este ator que desempenou papéis notáveis no cinema.
Daí autoquestionei-me: será que Elvis Presley e Bruce Lee, tiveram atuações
mais expressivas que Marlon Brando? Quantos neste mesmo diapasão, por esse
mundão de Deus, se encontram empunhando a mesma nota musical dó? Se é que
podemos chamar desinformação a circunstância de desconhecer o valor de uma nota musical, desenhada
nas linhas de um pentagrama valioso na partitura que irá dar brilho e sons
melódicos, para uma sonata ou um belo arranjo orquestral. Seria mais apropriado
considerarmos o substantivo, lástima, desventura.
Há
10 anos morre Marlon Brando, aos 90 anos e, a história do cinema se resume num
epílogo: antes e depois de Brando. A revista Time, em 1999, citou Marlon
Brando, junto a Charles Chaplin e Merilyn Monroe, entre as cem pessoas mais
importantes do século passado. Nasceu em 3 de abril de 1924 e morreu em 1º de
julho de 2004, em um hospital de Los Angeles por insuficiência respiratória.
De
temperamento irrequieto e rebelde, tinha o dom da interpretação nas veias e na
alma. De 1943 a 1944, estudou teatro no New School em Nova York, onde aprendeu
o método “Stanislavsky”, que imprime uma técnica diferenciada, onde o ator se
identifica de forma psicológica com o personagem, ou seja, incorpora aquele a
quem está representando. Mas foi com Stella Adler a única professora nos
Estados Unidos que realmente tivera contato com Stanislavsky, do Actor’s
Studio, que Brando encontrou o seu caminho, tornando-se em pouco tempo, uma
revelação no teatro e no cinema.
Marlon
Brando foi um talento que o cinema até hoje tem como referência. Astros como
James Dean, Paul Newman, Robert De Niro, Sean Penn, Al Pacino, Gene Hackman,
buscaram inspiração e projeção seguindo o exemplo de interpretação e o legado
inigualável de Brando.
No
mesmo instante em que era considerado um gênio, sua outra face obscura e
imprevisível tomava forma, tornando-o indomável e insurgente. Quando conquistou
o seu segundo Oscar, em 1973, pelo filme “O Poderoso Chefão”, enviou uma
representante indígena para recebê-lo e falar em seu nome, um discurso de
protesto, escrito por ele mesmo, contra o modo que os Estados Unidos e
Hollywood, tratavam de forma discriminatória os nativos americanos.
Sua
maneira de pensamento lógico e de comportamento, era tão imprevisível que certa
vez, declarou à revista Time, uma das mais respeitadas e lidas nos EUA, que ser
uma estrela de cinema não é nada importante, Gandhi, Freud e Karl Marx, estes
sim, eram importantes. Atuar era uma atividade tola e chata. Todo mundo sabe
representar e exemplifica: “Quando queremos algo, quando queremos que alguém
faça algo, nossas atitudes são uma representação, portanto, atuamos o tempo todo.”
O
cineasta Martin Scorsese, o jornalista Weden Carlos e muitos outros críticos e
amantes do cinema o considerou como sendo o maior ator de todos os tempos.
Scorsese chegou a dizer: “Existiu o cinema antes e depois de Marlon Brando.”
Várias
divas do cinema e socialites norte-americanas, não resistiram ao seu encanto e
o seu poder de sedução. Por vários motivos, dentre eles, sua aparência máscula,
vigorosa e suas impetuosidades nada convencionais. Seu primeiro casamento foi
com Anna Kashfi, depois foi com a atriz Movita Castaneda e finalmente com uma
nativa de Bora Bora, Tarita Teriipia. O número de filhos até ele desconhecia,
estima-se que 16, mas reconhecidos foram apenas 11: Christian, do seu
relacionamento com Anna Kashfi; Miko Brando e Rebecca, filhos com Castaneda;
Teihotu e Cheyenne, com Terita Teriipia; Nina, Myles e Timothy Brando, com
Maria Ruiz; e outras duas filhas Maimiti Brando e Raiabua que pouco as
conheciam.
Marlon
Brando deixou uma herança avaliada em US$ 21,6 milhões, entre imóveis de luxo,
valiosa coleção de obras de artes e roteiros de cinema. Todo esse patrimônio
foi dividido entre os 10 filhos vivos, já que Cheyenne não pertencia mais ao
mundo terreno. Excluiu da bolada, conforme testamento, a filha adotiva Petra
Brando Corval e o seu neto Tuki Brando, filho de Cheyenne.
O
início do desapego profissional e consigo mesmo, começou em 1980, quando se
retirou para a ilha de Tetiaroa, na Polinésia Francesa, um balneário de luxo na
ilha que comprou no Taiti em 1966. Nesse período Marlon Brando, ganhou peso (40
quilos) causado pela comilança desmedida, sendo várias vezes, fotografado
usando largo sarongue polinésio. Seu corpo foi cremado em cerimônia privada em
Los Angeles e suas cinzas jogadas ao mar, na ilha Tetiaroa de sua propriedade.
Morre um astro gênio de Hollywood, mas sua estrela jamais deixará de brilhar.
Talento de Marlon Brando
fez dele um dos atores mais marcantes do cinema
Por Inácio Araújo
Especial para o UOL
Especial para o UOL
Marlon Brando nasceu
para brilhar e sabia disso. Era o aluno mais brilhante da classe no Actor’s
Studio, mas também indisciplinado e, segundo colegas, preguiçoso. Isso não o
impediu de revelar já em seu filme, “Uma Rua Chamada Pecado” (1951), não apenas
o carisma e a beleza máscula, como também o imenso talento.
A história chegara ao
cinema pelas mãos de seu mestre no Actor’s e no teatro, Elia Kazan, e o filme
era uma adaptação da peça de Tennessee Williams que Brando interpretara durante
dois anos, em 1947 e 1949, na Broadway, sempre sob a direção de Kazan.
“Uma Rua Chamada
Pecado” representou sua primeira indicação ao Oscar de melhor ator, que perdeu
para Humphrey Bogart em “Uma Aventura na África”. Com Kazan rodaria ainda “Viva
Zapata” (1952), e dois anos depois, em 1953, “Sindicato de Ladrões”, que rendeu
seu primeiro Oscar de melhor ator.
Marlon Brando não
precisava fazer grande esforço para ser grande. Foi um magnífico Marco Antonio
em “Júlio César” (1953), de Joseph L Mankiewicz – adaptado de Shakespeare – e,
com a mesma desenvoltura, o motoqueiro de “O Selvagem” (1953), que podia não
ser um grande filme, mas marcava, junto com James Dean, a figura do jovem
rebelde.
O sucesso parecia
entediar Marlon Brando. Suas interpretações tornaram-se, com o tempo,
mecânicas. Impunha-se o carisma. Havia exceções, como o belo “Casa de Chá do
Luar de Agosto” (1956), de Daniel Mann. O faroeste “A Face Oculta” (1961),
dirigido por ele mesmo: uma realização caprichada, mas também caprichosa,
demorada, dessas de deixar o produtor enlouquecido. O legado ainda hoje parece
formidável – para ele e para Karl Malden, seu parceiro de Actor’s Studio.
Na virada dos anos de
1960 e 1970, com o mundo se esquerdizando, Brando parece ter encontrado a si
mesmo, o que concretizou numa série de belos papéis. Em “Queimada (1969), de
Gillo Pontecorvo, depois em “O Poderoso Chefão” (1972) e “Apocalypse Now” (1979),
com Francis Ford Coppola, e em “O Último Tango em Paris” (1972), de Bernardo
Bertolucci.
Foi como se os novos tempos representassem um novo desafio para
Brando, como se precisasse voltar ao investimento dos primeiros tempos. Mas
Brando já era uma outra pessoa. Contemplado com um segundo Oscar, por “O
Poderoso Chefão”, mandou para recebê-lo uma índia, em sinal de protesto contra
o genocídio praticado pelos brancos e o tratamento atual aos nativos da América
do Norte.
A partir dos anos 1980,
a carreira de Brando se caracterizou, sobretudo, por participações especiais,
em que recebia grandes cachês por pouco tempo de filmagem. Vendia seu nome,
resumindo, sabia do seu valor de troca e parecia se incomodar cada vez menos
com seu valor de uso.
Nos últimos anos de
vida, aliás, vários dos papéis que aceitou foram para pagar os advogados que
representavam os seus filhos. Brando disse certa vez que fora um péssimo pai, e
os fatos o confirmavam. Um de seus filhos passou anos preso, por assassinato do
cunhado. A filha se suicidou.
Tudo que de sóbrio já
anunciava o personagem do “polaco” Kowalski em “Uma Rua Chamada Pecado” ou “Um
Bonde Chamado Desejo”, no teatro e na vida, parecia ressurgir no corpo desse
homem agora envelhecido, entristecido e, sobretudo, imensamente obeso: como se
o ódio a si mesmo devesse se manifestar em sua imagem.
Em 1º de julho de 2004,
Marlon Brando se despede da vida terrena, envolto em sua própria sombra.
Ninguém mais tinha dúvida de que sua vida turbulenta se refletira em uma das
presenças de ator mais criativas e marcantes de todos os tempos.
François Forestier descreve
Marlon Brando em biografia
por André Barcinksi
Folha Ilustrada
Folha Ilustrada
Marlon Brando (1924 – 2004) foi o
maior ator de sua época, mas sua vida foi uma sucessão de tragédias. Lindo,
seduziu centenas de mulheres e homens, dormiu com metade de Hollywood e
destruiu a vida de muita gente. Uma filha se matou, assim como várias amantes.
O filho foi acusado de assassinato. Por onde passou, o ator deixou corações
arrasados e vidas despedaçadas. No final de sua vida terminou sozinho, obeso,
deitado num sofá, sem receber nem os amigos.
Forestier, crítico de cinema da
revista francesa ”Le Nouvel Observateur”, levou dois anos para escrever “Marlon
Brando – A Face Sombria da Beleza”, uma biografia curta e arrasadora sobre o
ator que mudou o cinema.
O livro foi amadurecendo durante três décadas, durante as quais ele entrevistou dezenas de amigos do ator. “Brando era extraordinariamente sedutor, e cada testemunha estava feliz em compartilhar suas histórias comigo. Este homem tinha tantas amantes que o livro poderia parecer um catálogo telefônico”, conta Forestier. Justifica sua admiração por Marlon Brando: “Era um ator incomparável e uma pessoa abominável, um monstro. Me interesso por monstros, acho que eles são nosso verdadeiro lado humano. Tentei revelar a monstruosidade do seu mundo.”
O livro foi amadurecendo durante três décadas, durante as quais ele entrevistou dezenas de amigos do ator. “Brando era extraordinariamente sedutor, e cada testemunha estava feliz em compartilhar suas histórias comigo. Este homem tinha tantas amantes que o livro poderia parecer um catálogo telefônico”, conta Forestier. Justifica sua admiração por Marlon Brando: “Era um ator incomparável e uma pessoa abominável, um monstro. Me interesso por monstros, acho que eles são nosso verdadeiro lado humano. Tentei revelar a monstruosidade do seu mundo.”
O autor diz que ficou impressionado
com a forma egoísta com que Brando tratava mulheres e filhos. “Ele simplesmente
não se importava com ninguém. Era um monstro do ego, um monstro de
infelicidade, um poço de solidão, sem bússola moral, sem senso de direção”,
avalia Forestier. E acrescenta: “Nos últimos anos de sua vida, estava apenas se
inclinando sobre a autodestruição, arrastando todos os seus filhos. Algumas
pessoas sonham com a criação de um mundo em chamas. Brando sonhou em fazê-lo
desaparecer num buraco negro.”
Forestier descreve os filmes estrelados por Brando, e é curioso perceber como o grande ator de obras-primas como “Sindicato de Ladrões” (1954) e “O Poderoso Chefão” (1972) também se meteu em abacaxis. Revela ainda o autor da biografia: “O mito de Brando é tão esmagador que ele se torna mais importante que seus filmes. A verdade é que um bom ator, está no seu melhor em filmes ruins. Sua arte transcende tudo. Se você gosta de Brando, esquece os abacaxis que estrelou”, expõe sua amargura em relação a Marlon Brando, Forestier.
Forestier descreve os filmes estrelados por Brando, e é curioso perceber como o grande ator de obras-primas como “Sindicato de Ladrões” (1954) e “O Poderoso Chefão” (1972) também se meteu em abacaxis. Revela ainda o autor da biografia: “O mito de Brando é tão esmagador que ele se torna mais importante que seus filmes. A verdade é que um bom ator, está no seu melhor em filmes ruins. Sua arte transcende tudo. Se você gosta de Brando, esquece os abacaxis que estrelou”, expõe sua amargura em relação a Marlon Brando, Forestier.
Até hoje, diz o jornalista, não há
ator que se compare ao talento de Marlon Brando. “Há um período, antes de
Brando e, depois de Brando. Ninguém o igualou até hoje. Ele era o deus dos
atores e o diabo também”, conclui.
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Imagens: Google
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4 comentários:
Excelente postagem sobre Marlon Brando, eu porem não sabia quem ele era, só depois de ver o comentário de que Marlon Brando, era o ator principal de o poderoso chefão, realmente um grande astro, excelente ator.
O Bússola literária está por sua vez ricamente enaltecido, em publicar textos de talentos extraordinários, que mesmo com a sua morte não passará despercebido pelos filmes excelentíssimos como de o poderoso chefão.
Parabéns Dilson pela publicação.
Bjus, Juloren
Valeu amiga, vc tem demonstrado uma seguidora presente no Bússola Literária, isto nos deixa muito contente e envaidecidos. Obrigado pela visita, o seu gentil e simpático comentário. Continue nos dando o prazer da sua valorosa visita. Obrigado de verdade... Abraço fraterno...
Devo confessar que não o conhecia. No entanto depois de ver essa postagem vi a grandeza de Marlon Brando e tive um desejo enorme de tê-lo conhecido! Mesmo com as palavras perigo, perigo, perigo a quem chegava perto do ator, vejo nele a notável personalidade com alma de artista. Quem possue um talento assim não consegue se conter com o mundo exterior; precisa jogar para fora o que tem de dentro . Marlon foi pura emoção sendo até impulsivo em suas atitudes! Mas não é um mal ser assim... Pode se tornar quando isso é revelado para si mesmo. Infelizmente foi o que ocorreu com nosso rebelde ator. Dilson Paiva continue tendo esse capricho com a literatura. É muito honrado o seu trabalho, digno de elogio! A Bússola Literária é e tem se tornado um grande registro de como a leitura, o cinema, a escrita renovam o mundo e encontram talentos invisíveis aos olhos comuns. Ana Luísa, escritora.
Olá Ana Luísa, quanto a não conhecer os filmes, nos quais Marlon Brando atuou, há muito tempo, as locadoras de vídeos disponibiliza-os, é só procurar e escolher o título que mais se encaixará com o seu momento. No entanto, recomendo todos indistintamente. Obrigado pela visita ao Bússola Literária, espero que continue nos dando a alegria da sua presença, sempre que possível, registrando o seu gentil comentário. Forte abraço.
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