domingo, 8 de março de 2015

Neste ano é comemorado o aniversário de 80 anos de Mauricio de Sousa




Bússola Literária está contente poder retratar a carreira vitoriosa do quadrinista Mauricio de Sousa nos últimos anos. Esta é uma homenagem comemorativa ao seu aniversário de 80 anos. No dia 27 de outubro de 1935, nascia em Santa Isabel-SP, o mais notável expoente dos quadrinhos brasileiro, a ocasião merece um brinde, tim tim.  Quando referimos os últimos anos, se deve ao vasto e variado material que você encontra disponível na Internet. Vão perceber que nem tudo foram flores para o nosso homenageado. Em seu caminho surgiram vários contratempos que o impediram dar sequência aos seus sonhos de incrementar projetos duradouros. Os motivos estão visíveis no decorrer da leitura.

Para esta publicação Bússola Literária, teve o cuidado de evitar ser repetitivo, mas no decorrer das pesquisas, vão notar que se trata de uma tentativa praticamente impossível, mesmo porque, os personagens da Turma da Mônica estão em todos os quadrantes da vida das crianças no Planeta. No entanto, tenho certeza que ficarão um pouco mais conectados com o BL, não só pelo material escrito, mas, sobretudo pelos vídeos.








Sabemos o quanto somos preguiçosos para estar acompanhando todas as ações e movimentações desse mega desenhista e empresário das HQs. Então vamos fazer um tour pela galáxia de Mauricio de Sousa e sua galerinha que contagia pela leveza de suas historinhas, tupiniquins e alienígenas em todo universo onde há uma criança ou adulto que um dia teve na infância a liberdade para brincar, correr e contemplar a alegria de ser feliz.

A revista Isto É, no seu caderno Isto É Dinheiro, edição de 12 de julho de 2008, o jornalista Carlos Sambrana, descreve a importante conquista de Mauricio de Sousa no país continental chinês, sob o título: Turma da Mônica em mandarim, e o subtítulo: Prestes a completar 50 anos de carreira, Mauricio de Sousa avança sobre o mercado chinês e bate recordes no mundo dos quadrinhos.

Pela avaliação de Carlos Sambrana, nesse meio século, Mauricio teria publicado mais de um bilhão de revistas em 120 países, produzido 12 longas-metragens da Turma da Mônica, ter a incrível soma de cerca de três mil produtos licenciados e a gigantesca engrenagem alimentada por suas criações, que anualmente movimentam US$ 2 bilhões e ainda, emprega 30 mil pessoas direta e indiretamente. Realmente os números revelam um Mauricio vitorioso, contudo, um virtuoso incansável sempre em busca de novos projetos, alguns inclusive, em andamento: “Teremos a TV Mônica no YouTube, vamos inaugurar sete novos Parques da Mônica, sendo quatro na Europa, um em Luanda e mais dois no Brasil. Levaremos espetáculos teatrais com a Turma para todo o País; estamos produzindo um filme de animação digital do Horácio e entramos com força no setor educacional”, diz.

Mauricio deixa bem evidente que o seu projeto educacional é a sua menina dos olhos: “É o meu grande sonho, levar a Turma da Mônica para as escolas”. Eis que o seu sonho começa a desenhar na China. Em 2007, quando estava em uma feira de quadrinhos em Bologna, Itália, o desenhista foi procurado por representantes do governo chinês, os quais buscavam personagens para fazer parte da cartilha curricular das escolas de ensino básico. “Eles me disseram que escolheram a Turma da Mônica, porque não tinha violência, era alegre e tinha valores como, por exemplo, respeito ao próximo e ao meio ambiente. O ministro chinês disse, inclusive, que os personagens eram chineses, porque tinham o olho grande típico dos desenhos orientais. A China se tornará o nosso maior mercado no mundo e a Turma da Mônica alcançará outro patamar”, conta expressando largo sorriso.
Na revista Exame, edição de 10 de agosto de 2011, caderno Negócios, a jornalista Daniela Barbosa, escreveu um artigo, cujo título Por que chineses e até árabes querem a Turma da Mônica, dá à dimensão do quanto o desenhista tem ultrapassado vales e montanhas para alcançar os seus objetivos. No seu texto ela destaca a observação feita pelo mago dos quadrinhos, sobre sua possível incursão pelos países muçulmanos: "Nossa última proposta foi de um grupo árabe. Eles queriam investir 1,8 bilhões de reais, mas não era o momento. Não estávamos preparados. Hoje já podemos voltar a conversar", diz Mauricio. No decorrer da entrevista concedida à jornalista, o desenhista esclarece sobre o que representa a China para os negócios da sua empresa, Mauricio de Sousa Produções: "Nosso negócio com a China está apenas começando. O país é enorme e temos muito que crescer lá. Deu certo, porque fomos procurados por eles para ajudar na alfabetização das crianças chinesas e, depois que entramos nas escolas, fomos também procurados para desenvolver livros, material para TV e tiras de jornais." diz ainda: "Os chineses fizeram a análise do nosso trabalho que eu gostaria que fosse feita no Brasil: a de que, nossa proposta com a Turma da Mônica tem relação com ética, coleguismo e solidariedade", ressalta.

Nesta mesma entrevista Mauricio faz outra revelação importante em termos de valores financeiros, relativo ao mercado chinês: “É o maior negócio, pois estamos diretamente ligados à educação de mais de 180 milhões de pessoas, mas fora do país, não é o negócio mais rentável. Fizemos material de TV para a Itália, este seria nosso maior retorno no mercado externo.” Ainda no que tange ao mercado externo, diz Mauricio: “As histórias da Turma da Mônica, são traduzidas para 32 idiomas, mas devemos estar presente em cerca de 50 países. Claro que não temos todos os nossos trabalhos em todos eles. Falta, no entanto, incentivo no Brasil para que a gente consiga levar nossos produtos licenciados. Estou brigando para que haja mais incentivo do governo, pois quando eu estiver em 100 países, quero vender nossa marca a preço de produto chinês”, desafia.
O Portal Japão, revista online da comunidade japonesa no Brasil, publicou em 13 de janeiro de 2008, na sua coluna Arte e Cultura, artigo assinado por "mkanno", sob o título: Mauricio de Sousa é definido para criar mascote do Centenário, após concurso sem vencedor, em que esclarece a tentativa frustrada da Associação para Comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil (ACCIJB), para definir a mascote do evento. Cerca de 200 trabalhos foram inscritos, no entanto, nenhum deles conseguiu exprimir a essência do acontecimento, conforme imaginara a ACCIJB. Para essa missão, procuraram o Mauricio, que se prontificou de imediato. “É uma honra e um desafio que já considerava aceito. Estou pensando numa mascote que as pessoas entendam e se identifiquem, e que, simbolize a magia do Centenário. Esse trabalho é gratificante e gostoso. Requer cuidado e carinho, porque o personagem está nascendo aos poucos, do coração”, explica Mauricio.

Por outro lado, o desenhista tem motivos para estar contente com a missão. Desde 1963, Hiro, personagem nas histórias rurais da Turma do Chico Bento, vem representando a comunidade japonesa, através das HQs. Hiro ou Hiroshi é nissei e mantém as tradições orientais dos seus ascendentes. Em 1994, outros dois personagens de origem japonesa Nibus e Do Contra, também incorporaram às criações de Mauricio. Inclusive Do Contra, foi inspirado no filho caçula do autor, com Alice Takeda, descendente de nissei, com a qual tem outros dois filhos.

Do resultado desse compromisso assumido com a ACCIJB, Mauricio criou as mascotes Tikara e Keika. Em obidiência as perspectivas de inovações e ressaltando a tendência dos mangás, a Turma da Mônica Jovem reforçou a parceria entre o Mauricio e o mangaká (desenhista de mangás) Osamu Tezuka, falecido em 9 de janeiro de l989. Na edição nº 43 da Turma da Mônica Jovem, traz um crossover entre os personagens da Turma e os do mestre desenhista japonês Osamu, criador de obras como, A Princesa e o Cavaleiro, Astro Boy e Kimba, o Leão Branco. Esta edição especial da Turma da Mônica Jovem é um convite aos jovens brasileiros a visitarem o Japão pós-tsunami, para presenciarem sua reconstrução. A qual demonstrou como essas ações foram felizes em aproximar Brasil e Japão por meio da interação cultural.

Em reconhecimento à sua contribuição com a integração cultural Brasil-Japão, Mauricio de Sousa, foi agraciado com a Ordem do Sol Nascente, Raios de Ouro com Roseta, honraria concedida diretamente pelo Imperador do Japão, Akihito, para personalidades que notadamente contribuíram para a divulgação da cultura japonesa em seus países. Esta comenda foi criada em 1875, pelo Conselho do Estado e entregue ao desenhista pelo Cônsul Geral do Japão em São Paulo, Noriteru Fukushima, a qual tem em seu nome a expressão “Sol Nascente”, que simboliza a energia e o poder dos raios do Sol, simbolizando o Japão. O processo de escolha é estudado por meses, sobre farto material captado a respeito dos possíveis laureados, em total sigilo, para não despertar expectativas. Neste processo, são colhidos materiais e testemunhos que justifiquem a láurea e o homenageado é comunicado somente quando todos os procedimentos estiverem concluídos.

O jornal Folha de São Paulo na edição de 13 de outubro de 2013, publicou no seu caderno Folha Ilustrada, por meio dos enviados especiais, Cassiano Elek Machado e Raquel Cozer, matéria sobre a Feira do Livro de Frankfurt, na qual Mauricio de Sousa e outros cartunistas também estavam presentes. Nesta matéria Mauricio revela ter sofrido boicote de distribuidora na Europa. Contou que, nos anos 80, publicou, por quatro ou cinco anos, a Turma da Mônica na Europa, com tiragens de 50 mil exemplares, vendidos especialmente na Alemanha.

Esclarece ainda: “Mas começamos a esbarrar em esquemas existentes de empresas que publicavam quadrinhos naqueles países, as quais temiam que a gente atrapalhasse.” Acrescentou dizendo ter descoberto, com um jornaleiro português que morava na Suíça e conhecia seu trabalho, que as bancas tinham “recebido ordens da principal distribuidora para não vender e devolver todo o material à editora”, diz.

“O jornaleiro me mostrou as revistas no fundo da banca. O grupo, não vou citar qual, temia que dominássemos o mercado”, disse. Os quadrinhos eram publicados na Europa por selos ligados à alemã Ehapa Verlag.” Disse ainda Mauricio, ele preferiu interromper as publicações. Só agora, depois de iniciativas isoladas, Mauricio de Sousa está voltando aos principais países do mercado europeu, segundo informou em entrevista à Folha após o debate.

A obra do autor é publicada em 32 idiomas e distribuída em 50 países. O maior mercado é a Indonésia, onde, por muito tempo, acreditou-se que a Mônica era um personagem local. “Quando a revista saiu lá, o país estava num regime ditatorial que proibia menção ao português por causa da briga com o Timor Leste”, conta. Agora, a meta do quadrinista, que vendeu 1,2 milhão de cópias de livros no Brasil em 2012 (o número de revistas em bancas ele não informa), é se firmar no mercado de animações para crescer no exterior, especialmente nos países de língua inglesa, onde é inédito. “Estou me reservando para os Estados Unidos. É a última fronteira”, brincou.

O jornal O Globo, publicou na sessão Religião, da sua edição de 28 de novembro de 2014, matéria sob o título Mauricio de Sousa lança Meu pequeno evangelho, livro da Turma da Mônica sobre o espiritismo. O livro traz André, primo espírita do pai de Cascão, ensinando ao Cebolinha, Cascão, Magali, Anjinho, Penadinho e aos demais, a doutrina codificada no século XIX pelo francês Allan Kardec. A obra publicada pela Editora Boa Nova, lançada em dezembro na livraria Cultura, na presença de Mauricio, ressalta a Turma da Mônica aprendendo os ensinamentos de Jesus Cristo, contidos no Evangelho segundo o espiritismo, principal obra do kardecismo.

Para esta nova fórmula de levar os ensinamentos espíritas sobre o cristianismo às crianças, as 64 páginas do livro foram ilustradas por Mauricio e idealizadas pelo designer peruano Luis Hu Rivas e pelo administrador baiano Alã Mitchell, ambos espíritas. Na história, a Turma da Mônica recebe a visita de André, primo do Seu Antenor, pai do Cascão, seguidor da religião. Esta visita desperta nas crianças a curiosidade sobre os conceitos do evangelho que todos podem usar no dia a dia, independente da religião através da qual devotam sua fé. São mensagens de amor, caridade, pureza, paz, felicidade, humildade, misericórdia, perdão... contadas de forma divertida utilizando-se os personagens como mensageiros.

Em entrevista a Alexandre Lucchese, do jornal Zero Hora, edição de 06 de dezembro de 2014, cuja qual acreditamos ser a última com tamanha abrangência e consistência publicada até o momento, o extraordinário Mauricio, fala da carreira e dos planos para o futuro. A entrevista aconteceu durante a realização da 60ª Feira do Livro, em Porto Alegre-RS, na qual o autor quadrinista, realizou uma sessão de autógrafos que durou mais de três horas. Leia na íntegra a entrevista:

O senhor veio a Porto Alegre para lançar um álbum comemorativo aos 50 anos da personagem Magali. Qual foi a inspiração para essa que é uma de suas criações mais reconhecidas?

Mauricio: A Magali não rejeita um bom prato, é alegre, sempre de bem com a vida. Ela tem muito a ver com minha filha Magali, que é permanentemente festiva e muito brincalhona. Foi em cima das características dela que, muitos anos atrás, eu criei a personagem. Era um tempo em que estava precisando de personagens femininos. É preciso lembrar que, quando ela apareceu, o grupo não se chamava Turma da Mônica, e sim, Turma do Cebolinha – ele havia sido criado antes e mandava na história. A Magali dos quadrinhos nasceu na mesma época da Mônica, também inspirada em uma das minhas filhas. Na vida real, Magali tinha um ano e meio, e a Mônica tinha dois anos e meio.

Mas foi a Mônica que se destacou na turma.

Mauricio: Sim, a Mônica apareceu e roubou a cena com seu temperamento forte. No entanto, entre os leitores, Magali tem tanta força quanto ela. Mônica é mais lembrada, mais forte, mas Magali é mais carinhosa. Em qualquer lugar, se perguntarem que personagem as crianças querem que eu desenhe as duas vão ter o mesmo número de pedidos.

Além dos livros e revistas, seus personagens estão em diversos empreendimentos e produtos comerciais. O senhor imaginava que poderiam alcançar tanto sucesso?

Mauricio: Não. Na minha vida inteira, evitei trabalhar com futurologia, porque se a expectativa não fosse cumprida, ficaria frustrado. Mas desde sempre eu queria fazer exatamente isso que faço. Já era meu desejo criar histórias em quadrinhos, desenhos animados, parques temáticos, merchandising, tudo antes de construir esses personagens que construí. A única coisa que não planejei há 50 anos foi a internet, já que não havia como adivinhar que ela viria. Mesmo assim, em cima das histórias da época, intuí que viria uma tecnologia que transformaria tudo.

As histórias em quadrinhos anteviram aspectos da sociedade atual?

Mauricio: Vi os primeiros sinais disso nas histórias de Alex Raymond (1909 – 1956), criador do Flash Gordon. Ali havia de tudo: televisão, minissaia, viagem interplanetária. As HQs anteviram muitas coisas que aconteceram, estão acontecendo e acontecerão em diferentes campos: tecnologia, relações humanas, aspectos sociais. E até coisas mais trágicas, como o fim do mundo, a crise da falta de água e o desmatamento. Nas nossas histórias, fomos sempre muito suaves nas tomadas de posição, mas há 50 anos Chico Bento já falava em ecologia, na importância do cuidado com a natureza, que hoje é um dos temas da hora.

Quais foram as maiores dificuldades para desenvolver esses temas?

Mauricio: Às vezes, é preciso ter cuidado com as respostas, pois, quando você pergunta isso, a primeira coisa que vem à mente é “puxa vida, se eu não estivesse no Brasil, conseguiria tudo com mais facilidade”. Mas não posso me queixar, consigo fazer muitas coisas aqui, mesmo vivendo em um lugar em que há tantos obstáculos. Agora, uma grande frustração é que tenho os melhores personagens, cerca de 2,5 mil produtos em linha permanentemente e, no entanto, estou impedido de exportar esse material para alegrar a criançada no exterior por causa do Custo Brasil. Vários países, organizações, lojas e distribuidoras nos procuram, mas não podemos atendê-los porque esbarramos em um sistema que não está preparado. Isso talvez nos levará a uma situação que eu desejaria que não chegasse: vamos precisar fabricar no exterior e exportar para o Brasil a Turma da Mônica em produtos de outros países.

Um grande desafio parece ser o dos parques temáticos. O Parque da Mônica foi fechado em 2010, deixando dívidas de R$ 40 milhões. Por que isso ocorre?

Mauricio: Ainda não existem brinquedos de tecnologia sofisticada no Brasil, e por isso é necessário importar. Aí, de novo, o fantasma do Custo Brasil chega – fica pesado, a conta não fecha, então não dá para fazer parques temáticos no Brasil. Não quero mais ser dono de parques temáticos. Isso é uma coisa para grandes investidores, grandes grupos que podem trabalhar com o que eu crio. O que estou fazendo, neste momento, é a busca para fechar negócios com essa fórmula. Posso criar tudo, dar cobertura, alimentar um parque inteiro com elementos e temas, personagens e o que for, mas minha atividade propriamente dita deve ser cada vez mais focada na criação de conteúdo. Só. Para o restante, é preciso investidores. No cinema, ocorre o mesmo. Estamos negociando com organizações que mexem com isso no mundo todo. No que diz respeito aos parques, a coisa ainda está mais devagar, não temos grandes investidores. Mas essas novas fórmulas irão sair do papel. Enquanto não saem, estamos investindo em desenhos animados para a televisão, que não é um mercado tão pesado em termos de custos.

Um grande desafio parece ser o dos parques temáticos. O Parque da Mônica foi fechado em 2010, deixando dívidas. Na sua opinião, o Estado deveria apoiar empreendimentos como esses?

Mauricio: Não. Não devemos contar com o Estado, nem no Brasil, nem em outros lugares do mundo. O único país em que o Estado, em alguns momentos, foi decisivo, muito forte e ajudou bastante foi o Japão. Lá, o governo torce, investe, faz com que os mangás sejam um produto de exportação maravilhoso. Mas, mesmo assim, há crises. Não crises do sistema, mas de excesso de artistas, ideias e personagens. Eles fazem muito e, sempre que há excesso, alguém sofre. Sem dúvida, em algum momento, nossos produtos também estarão no Japão. Estou abrindo um sistema para poder trabalhar com maior liberdade em vários países, promovendo nossas criações em escala mundial. No Brasil, já temos mais de 80% do mercado de publicações infantojuvenis (de histórias em quadrinhos). Sem megalomania, vamos buscar a expansão, devagarinho, fazendo o que dá. Sou jovem e tenho muito tempo de vida pela frente. Acho que poderemos brincar bastante (risos).

Na hora de criar histórias e personagens, como você faz para se comunicar com públicos de diferentes idades e lugares?

Mauricio: É preciso focar uma área do público e ir em direção a essa faixa. Eventualmente, nas beiradas há uma pessoa que, por aproximação também pode gostar. O ideal é que o conteúdo, o texto e a ideia sejam bons.  E que você respeite o leitor, mas jogue a mensagem com uma linguagem fácil, transparente. Se você fizer isso, pegará publico sempre. Para facilitar um pouco a vida, eu tinha as histórias infantis, que fizeram o maior sucesso, mas, em algum momento, estrategicamente tive de criar um produto para os jovens, porque a criançada estava largando minha revista com 10 ou 12 anos achando que “era coisa de criança”. E aí eles iam ler mangá japonês. Então, resolvi criar o mangá caboclo, que é a Turma da Mônica Jovem. Fiz esse trabalho nos mesmos moldes físicos dos mangás japoneses e, hoje, a Turma da Mônica Jovem se tornou a nossa revista de maior sucesso.

Depois dessa incursão junto aos jovens, qual é o próximo desafio da Turma da Mônica?

Mauricio: Já que estamos na adequação de gostos e estilos, estou pensando na Turma da Mônica Adulta, que vai nos dar um trabalho danado e assusta o pessoal do meu estúdio. Sei que vou me arrepender desse negócio, mas já comecei o trabalho (risos). Preciso de mais uns três anos para começar a colocar no papel. É bastante tempo, mas é assim. A Turma da Mônica Jovem demorou uns cinco anos para ser lançada. Demorou para que eu convencesse o pessoal do estúdio de que era possível, viável. Lá, cada desenhista se sente um pouco dono da turma, então todos ficam assim meio “Ih, meu Deus, vamos mexer! Por que mexer em time que está ganhando?”. Mas precisamos mexer! É questão de maturação da proposta editorial. Na medida em que o tempo passa, os gostos se alteram e a vida também muda. Precisamos estar prontos para as mudanças, fazer parte delas, estar dentro delas.

Em 2009, uma de suas publicações para jovens, a revista Tina, causou repercussão ao sugerir que o personagem Caio fosse homossexual. Como é lidar com os temas tabus?

Mauricio: Quando o Caio surgiu, houve uma grita por parte do público: “Que pecado, que isso, que aquilo...” Há, ainda, muito preconceito quando se trata de propostas ligadas a qualquer coisa sobre a sexualidade. Como nossas histórias alcançam crianças, quem compra as revistas são os pais delas, que geralmente são mais conservadores do que os filhos ou mesmo os mais jovens. Então, realmente, tenho que ter cuidados. Falo para o meu pessoal de criação e roteiristas que a Turma da Mônica não deve levantar bandeiras, que essa não é a proposta das nossas revistas. Se as bandeiras estiverem mais consolidadas, podemos voltar a tocá-las, mas fazemos tudo no seu tempo.

Esse perfil que o senhor descreve para a Turma da Mônica é bastante diferente, por exemplo, da personagem Mafalda, do argentino Quino, que também já passou dos 50 anos.

Mauricio: Sim, é totalmente diferente. A Mafalda faz críticas contundentes, é uma personagem política. Já a Turma da Mônica brinca e faz algumas críticas veladas em alguns assuntos. Gosto mais do Quino como chargista do que como quadrinista. Como chargista, acho ele um dos melhores do mundo. Somos amigos, ele já foi ao meu estúdio duas vezes para ver como criamos as coisas, como tudo funciona lá. A Mafalda é um exemplo de como os quadrinhos, aparentemente infantis, podem mexer nas vísceras de um sistema.

O senhor nunca buscou a mesma contundência?

Mauricio: Desse modo, nunca busquei. Seria perigoso para a sobrevivência do meu estúdio. Fomos suaves. Em alguns momentos, como no período da ditadura militar, fizemos algumas parábolas, histórias que o leitor poderia entender de outra maneira. O Astronauta, por exemplo, tem uma história em que vai a um planeta onde cantar é proibido e dá cana. Ele é preso por chegar lá assoviando e encontra um rapaz na cadeia, preso por gostar de música, tocar guitarra e cantar. O Astronauta descobre que o garoto é da família do dono do planeta, mostrando que perseguição não tinha cor nem razão, não fazendo distinção na hora de prender e castigar. Isso foi no tempo do Figueiredo. Já no tempo do Geisel, fiz a Turma da Mata, na qual o Rei Leonino vigia toda a comunicação e a única coisa que lhe escapa são as histórias em quadrinhos. Então ele resolve que quer vê-las antes de serem publicadas e manda trazer o desenhista, um sujeito parecido comigo. Ele chega com sua equipe, arruma um lugar para todos trabalharem e, com isso, mostro como são feitas as HQs. Mas também faço uma sugestão de como o controle acontecia no regime: não é o rei que precisa ver as tiras. Há um local obscuro do castelo em que o ministro entrega os desenhos para uma turma que fica ali oculta, em escuridão completa. São os censores ou as eminências pardas, o pessoal que manda de verdade, dizendo se deve sair ou não.

Isso não lhe rendeu problemas?

Mauricio: Por incrível que pareça, não. Fiquei esperando os censores passarem pelo estúdio para me dar susto, mas não houve nenhum problema. Recentemente, conheci por outros motivos um sujeito que fora secretário do Golbery do Couto e Silva, tachado como o articulador dos destinos da ditadura. Quando ele me contou que era secretário, perguntei: “Me mata uma curiosidade: vocês nunca viram tal e tal história que eu fazia? Nunca houve nada comigo”. Ele me disse: “É lógico que a gente via, mas era uma história em quadrinhos, com personagens infantis. Já estava uma pressão danada sobre o governo, era preciso haver alguma pequena válvula de escape. A gente achava que aquilo não era tão perigoso a ponto de inflamar a população. Assim, você acabou se safando”.

O senhor disse anteriormente que tem um dos maiores merchandisings infantis do Brasil. Uma das críticas a esse tipo de publicidade é que ela estimula o consumo em crianças.

Mauricio: Tomara que estimule bastante o consumo, porque os produtos são bons, a mensagem é legal, está movimentando a economia, dando emprego para uma porção de gente. Cerca de 30 mil pessoas trabalham na produção dos nossos artigos dentro de diversas indústrias. Somo invadidos por empresas do mundo inteiro porque deixamos esse vazio. Então tramitando projetos em Brasília para proibir publicidade infantil, uso de personagens nos rótulos... Imagina: a embalagem de uma boneca não poderá ter a imagem da própria boneca! São coisas tão absurdas que não dá para compreender. Não dá para aceitar que deputados e senadores estejam perdendo tempo em um país com tantos problemas sérios, com proibições em uma área de produção que poderia nos tornar exportadores de conteúdo para o Japão e a China. Se o Brasil tivesse facilidades na produção e na exportação, logo poderia estar brigando com esses dois países, mas sucatearam as indústrias. São heróis aqueles que seguem produzindo e investindo no Brasil.

Mas a crítica é que as crianças não sabem diferenciar o que elas veem na publicidade do que é a realidade, fazendo com que consumam sem o mesmo discernimento dos adultos.

Mauricio: Antes mesmo das gritas atuais, eu já não fazia publicidade agressiva. Sempre tive o maior cuidado do mundo. Além disso, há uma legislação atual para podar e tomar providências sobre abusos. Mas há um pessoal que acha que o Estado deve substitui os pais no cuidado com as crianças. O que estão tentando fazer é puxar o pátrio poder para o Estado. Pensa: o Estado cuidar do que as crianças podem ou não fazer. Isso dará um bode danado, vai prejudicar muito essa criançada que não vai ter como brincar, como optar por um brinquedo, como discutir um desejo. Estão ignorando os pais como grandes exemplos para as crianças. Isso é desonesto com pais e mães.

Em abril, o senhor compartilhou em seu perfil no Instagram uma foto de uma menina que segurava um cartaz com a frase “Eu tenho direito de assistir à publicidade infantil”. Depois de receber muitas críticas, a foto foi excluída. Por que a decisão de retirá-la?

Mauricio: Se eu não a retirasse, seria linchado. Eu não fiz a foto, apenas a publiquei. A menina tem apenas 12 anos, mas é muito bem informada, fazia propaganda para a televisão. Ela e dezenas de crianças perderam trabalho na TV por conta dessa grita toda. Alguns desses atores-mirins tinham papel importante para sustentar famílias mais simples. Foram os primeiros a perder por conta dessa onda toda contra a participação das crianças na publicidade. A retirada da foto não representa uma mudança de opinião minha. Apenas pensei em proteger a menina.

Suas histórias infantis permanecem usando elementos de um Brasil mais pitoresco, das crianças brincando no campinho enquanto as mães preparam bolos e os deixam esfriar nas janelas. Como seguir reproduzindo esse cenário para leitores que crescem cada vez mais imersos em um ambiente povoado de tecnologia?

Mauricio: Eu misturo tudo isso. Se você percorrer esse Brasil, vai encontrar crianças brincando do mesmo modo que o Chico Bento, o Cebolinha e o Cascão. E também encontrará um monte de garotos convivendo com alta tecnologia, jogando e criando jogos em computador. As crianças estão sempre brincando de futuro, com alguma coisa que poderão fazer com recursos melhores quando adultas. Por isso, não se pode brecar a criança, sob pena de quebrar-se um espaço de criação que fará falta ali adiante. As crianças devem ter a experiência do campinho, de brigar por causa do bolo na janela e, ao mesmo tempo, também devem ter liberdade para sonhar, para entrar em um caixote e ir para a Lua através da imaginação.

O senhor tem filhos e parentes trabalhando em seu estúdio. Alguns administradores consideram essa uma conduta arriscada. Como funciona isso no seu trabalho?

Mauricio: Não é arriscado, é trabalhoso. Tenho 10 dedos para tomar conta de 10 filhos. Talvez essa seja a cota ideal (risos). Você precisa ter alguns cuidados básicos. Por exemplo, um filho não pode ser chefe do outro. Eles precisam trabalhar em áreas distintas, para que um não esbarre muito no trabalho do outro, mas não o suficiente para impedir que interajam. O pessoal que está na parte da criação musical interage com o teatro, assim como o teatro interage com o cinema e o desenho animado. Faço essa ginástica, e tudo acaba funcionando.

Para assistir as historinhas da Turma da Mônica no YouTube, clique aqui e escolha o vídeo da sua preferência. Para assistir o vídeo historinha da Turma do Chico Bento, clique aqui.


A propósito, você já acessou a fan page do meu livro infantil Juju Descobrindo Outro Mundo? Não imagina o que está perdendo. Acesse: www.fecebook.com/jujudescobrindooutromundo.

E o site da Juju Descobrindo Outro Mundo, já o acessou? Se eu fosse você iria conferir imediatamente. Acesse: www.admiraveljuju.com.br 




Imagens: Internet

Vídeos: YouTube