domingo, 25 de janeiro de 2015

O escritor Oswald de Andrade foi de fato, um modernista rebelde ou mimado?


A história literária de Oswald de Andrade é polêmica em termos de conduta. Primeiro seus princípios idealistas como escritor, foram influenciados pelo movimento de vanguarda européia, especialmente, pelo que já vinha ocorrendo no meio literário e nas artes francesa. Por questões ideológicas de renovação na estética da literatura nacional, canibalizou o que acontecia no velho continente, expelindo o acre do seu pensamento andrófago. Atitude que incitou o movimento que resultou a Semana de Arte Moderna, que aconteceu no Teatro Municipal de São Paulo, em 1922. Sendo ele inclusive, um dos integrantes do grupo dos cinco, ao lado das pintoras Anita Malfatti, Tarcilla do Amaral (esposa) e dos escritores: Mário de Andrade e Menotti Del Picchia. 

O movimento modernista, não era um projeto essencialmente literário, a proposta tinha como pano de fundo, promover o ufanismo em torno da cidade de São Paulo ao status de uma Paris vanguardista na época. Portanto, envolvia a arte, o urbanismo, a educação, com a construção de escolas e universidades, além de um pacote de iniciativas progressistas antropofágicas, onde Oswald de Andrade se destacava. No seu manifesto antropofágico ele sintetiza sua via de inovações, com a frase: "Tupi or not tupi, that is the question", uma analogia anarquista da célebre frase de Shakespeare, na peça Hamlet, “to be or not to be, that is the question”.

José Oswald de Sousa Andrade nasceu em São Paulo, dia 11 de janeiro de 1890 e faleceu, aos 64 anos, em 22 de outubro de 1954. Teve vários casamentos e quatro filhos com três esposas diferentes. As mais destacadas dentre suas esposas, foram: a pintora Tarcilla do Amaral e a poetisa ativista política, Patrícia Galvão, a Pagú. Filho único de família muito rica. Seus pais eram ilustres latifundiários urbanos, dos quais recebeu uma extraordinária herança econômica. Entretanto, Oswald de Andrade morreu pobre, praticamente esquecido e o passado resumido nos onze livros que escreveu, seis peças de teatro e seis manifestos. No entanto o seu legado literário é considerado por muitos intelectuais, como inestimável.

A escritora, compositora e cantora, Beatriz Azevedo, autora de “Antropofagia Palimpsestos Selvagens” e “Encontros Oswald de Andrade”, ambos os títulos a caminho de serem lançados no mercado editorial, registrou por meio de uma avaliação analítica do escritor, no seu artigo escrito  para o jornal O Estado de São Paulo, edição de 10 de janeiro (sábado) deste ano, sob o título: Oswald de Andrade completaria 125 anos neste domingos. Beatriz Azevedo enfatizou nesse “Especial”, situações sobre a personalidade deste ícone do modernismo brasileiro, senão o mais importante, irrequieto e mordaz idealista entre os modernistas. Achei oportuno compilar parte do artigo, por considerá-lo interessante tanto do ponto de vista de pesquisa, quanto pelo teor da sua linguagem inteligente, que se segue:

(...) A exemplo do Manifesto Antropófago, a utilização da polifonia de autores, e a partir desta, a multiplicação de pseudônimos, revela a eleição da pluralidade como linha de atuação crítica. Oswald de Andrade não apenas cita Mark, Freud e Nietzsche, como cria um Freud Nietzscheano, um Marx Freudiano, um Nietzsche Oswaldiano. A paródia e a mistura de elementos díspares numa mesma imagem sempre foram suas estratégias preferidas contra as ortodoxias.

Ao mesclar Anchieta e Padre Vieira, Jacy e Guaracy no seu Manifesto Antropófago, Oswald está propondo uma reflexão sobre as hierarquias, entre o que seria “pré-lógico” e “lógico”, entre o que é considerado “selvagem” ou “civilizado”. Confrontando o materialismo Marxista com a psicanálise Freudiana, e as visões do “selvagem” a partir da ótica de Rousseau ou de Montaigne, Oswald constrói o seu ponto de vista crítico. Nada disso é o “samba do ‘criolo’ doido”, ou um caldeirão de misturas aleatórias. Do ponto de Oswald, “Freud é apenas o outro lado do catolicismo. Como Marx é o outro lado do capitalismo”.

Sob o peso de possuir um gênio impulsivo e contestador (...) Oswald conseguiu ser expulso do Partido Comunista e da Aristocracia Rural Paulista, quando propôs a esses notáveis representantes hierárquicos do poder rural,  no Congresso da Lavoura que latifundiários dividissem os lucros da terra. Suas contradições pessoais, e também, as da história do Brasil, encontram-se nas frases emblemáticas do Manifesto Antropófago: “A nossa independência ainda não foi proclamada”.

Oswald de Andrade permanece vital para o mundo contemporâneo. Seus questionamentos abalam “o pensamento comprimido do brasileiro da atualidade”. Oswald já defendia, no século passado, que se escutassem os ameríndios, pois eles não sofrem de psicose como todos nós sofremos hoje. O poeta queria “ouvir o homem nu”; o resto é silêncio. E a pergunta de Oswald continua ecoando: “Será esse o brasileiro do século 21?”.

Só para esclarecer: é muito importante conferir os vídeos, eles completam as informações contidas no texto. Se não, com que finalidade estariam disponíveis?


Oswald de Andrade é o homenageado 
na Flip de 2011


Meu pai era um furacão, disse Marília de Oswald de Andrade, única filha viva do escritor, com sua quinta e última esposa, Maria Antonieta d’Alkmin. “Oswald vivia com minha mãe completamente apaixonado. Conviver com um casal assim, isso me formou, foi uma coisa muito forte”, revela Marília.
      
No dia 6 de julho de 2011, durante a realização da 9ª Edição da Flip – Festa Literária Internacional de Paraty, que aconteceu até o dia 10, se inspirou nos ideais antropofágicos de Oswald de Andrade. Na ocasião, mais de 20 autores de 13 países discutiram, em 18 mesas, ciência, filosofia, tecnologia, linguagem e muita literatura.






Oswald de Andrade influencia o Movimento Tropicalista e o Cinema Novo


Surgido no final da década de 60, o movimento tropicalista, liderado pelos cantores e compositores, Caetano Veloso e Gilberto Gil, seguidos das participações da cantora Gal Costa, banda Mutantes, Tom Zé, o maestro Rogério Duprat, Nara Leão e os letristas José Carlos Campinan e Torquato Neto; o movimento teve também, como um dos seus mentores intelectuais, o artista gráfico, compositor e poeta Rogério Duarte.

A proposta do tropicalismo era criar uma nova mentalidade no cenário musical brasileiro, inserindo fluídos modernistas na própria cultura num todo. De acordo com o site Tropicália, Um projeto de Ana de Oliveira, os tropicalistas deram um histórico passo à frente no meio musical brasileiro. A música brasileira pós-Bossa Nova e a definição da “qualidade musical” no País estavam cada vez mais dominadas pelas posições tradicionais ou nacionalistas de movimentos ligados à esquerda. Contra essas tendências, o grupo baiano e seus colaboradores procuram universalizar a linguagem da MPB, incorporando elementos da cultura jovem mundial, como o rock, a psicodélica e a guitarra elétrica.

Considerando ainda, do ponto de vista estético, as transformações na construção das letras das músicas, contou com a contribuição da introdução de instrumentos, como a guitarra, que permitiu a criação de ritmos dissonantes. Do ponto de vista ideológico, a ruptura se deu pela valorização da televisão como meio de expressão e, pelo fato, das letras cantarem um Brasil, em que havia aviões no ar e crianças descalças na terra, ou seja, uma música que mostrava que o moderno estava cada vez mais articulado com o atrasado.

Essas informações da vanguarda erudita por meio dos inovadores arranjos de maestros como, Rogério Duprat, Júlio Medaglia e Damiano Cozzela, mudaram conceitos e radicalizaram nas propostas. Ao unir o popular, o pop e o experimentalismo estético, as ideias tropicalistas acabaram impulsionando a modernização não só da música, mas da própria cultura nacional.

Como o período em que foi instaurado o movimento, o Brasil vivia sob o domínio da ditadura militar. Para driblar as correntes irreacionárias da época, perante aos responsáveis pela mudez das ideias e evitar qualquer iniciativa que abrisse os olhos da população, principalmente dos jovens, os artistas criavam letras inteligentes, distantes da compreensão perceptível dos grupos extremistas legalizados e orientados pelo próprio regime de exceção, portanto, as letras das canções teriam que ser inovadoras, criando jogos de linguagem, se aproximando da poesia dos concretistas.

Por meio de artifícios criativos, as mensagens das letras eram codificadas, exigindo certa bagagem cultural para que fossem compreendidas. "Alegria, Alegria" de Caetano Veloso não tem sentido óbvio, mas carrega em sua letra preocupações típicas da juventude da década de 60, um tormento com a violência da ditadura e um desejo de inovar, de romper barreiras.

Os tropicalistas implantaram um método de estética visual e de comportamento, no qual exibiam através das suas roupas coloridas e cabelos compridos, tendências que agregavam várias influências musicais nos seus manifestos de rebeldia. A intenção era chocar e, por meio de performances caracterizadas pela violência estética, protestar contra a música brasileira bem comportada. Influenciados pela contracultura, se apoderaram da linguagem da paródia e do deboche. Os tropicalistas transformaram a música popular brasileira, sendo grandes expoentes da arte brasileira de vanguarda.

Pascoal Farinaccio, no seu artigo, Oswald de Andrade e o cinema em dois tempos, ressalta, que a voz e as imagens do Cinema Novo procuraram seguir a estrutura pragmática heterodoxia do modernismo efervescente. Durante a fase populista da história do Brasil, no período compreendido entre 1945 e 1964, o que vinha de fora era frequentemente visto como impuro e, portanto, perigoso. Assim, a Coca-Cola e o cinema de Hollywood eram muitas vezes apontados como exemplos do imperialismo cultural norte-americano, ao passo que o samba e o Cinema Novo – feito com “uma ideia na cabeça e uma câmara na mão”, de acordo com Glauber Rocha – eram considerados exemplos do que havia de mais autenticamente nacional. O filme A Grande Arte, apesar de ser dirigido por um brasileiro e rodado no Brasil, é falado em inglês. Filmes como O Quatrilho e O Que é Isto Companheiro, são estrelados por artista da Rede Globo e concorrem ao Oscar, contratando lobbies profissionais para que estes fossem premiados.

Sobre o formato conceitual de se criar um cinema com o corpo e a cara do Brasil moderno, Oswald de Andrade foi sem dúvida, o modernista que melhor conseguiu elaborar uma prosa de ficção nutrida de uma técnica narrativa cinematográfica, valendo-se dessa para ampliar o seu campo de experimentação linguística. Providencial exemplo é o seu romance publicado em 1924, Memórias Sentimentais de João Miramar, cujo conteúdo constitui deliciosa sátira aos intelectuais parnasianos, que ainda gozavam de prestígio cultural na provinciana São Paulo dos anos 20.

Levando-se em conta a mesma capacidade de síntese e fusão de palavras, encontra-se também, no livro de poesias Pau-Brasil, de 1925. O câmera eye oswaldinao, é aqui ainda mais radical na apreensão e condensação da matéria externa, com a qual lida. Veja essa referência ocorrida neste diálogo O Capoeira, fragmento do poema Pau-Brasil.

- Qué apanhá sordado?
- O quê?
- Qué apanhá?
Pernas e cabeça na calçada.

Nota-se, de um lado, a aproximação da linguagem literária com a oralidade popular – Qué, sordado –, respeitando-se o preceito do Manifesto da Poesia Pau-Brasil, que preconiza o aproveitamento da “contribuição milionária de todos os erros”, aproximando-se assim, a poesia modernista da vida cotidiana; de outro, verifica-se mais uma vez, uma sintonia fina com a linguagem cinematográfica. O poema se assemelha uma tomada de uma cena de rua extremamente rápida, em sua movimentação: antes que o “sordado” responde o golpe de capoeira, este já foi dado.

Um bom exemplo do diálogo do cinema brasileiro com a literatura de Oswald, naquilo que ela tem justamente de traço propositalmente grosso, exagerado, caricatural a definir personagens e situações, é o filme de Rogério Sganzerla. O Bandido da Luz Vermelha, de 1967. Aí, o famigerado bandido, que se autodefine diversas vezes ao longo do filme como um “boçal”, bandido mequetrefe metido num “faroeste do terceiro mundo”, é caracterizado por uma recorrente voz over, em termos retirados do romance Serafim Ponte Grande, de Oswald de Andrade.

No filme vigora o mesmo tom desabusado, paródico, kitsch, que tangencia o mau gosto e empreende a apropriação dos produtos massificados da cultura de massa – em suma, ocorre uma fina sintonia entre o tom do filme e a composição do Serafim. Do ponto de vista ideológico, o crítico Ismail Xavier, observa com acuidade que O Bandido da Luz Vermelha, reúne em si dois momentos do romance oswaldiano: o diagnóstico da visceral “incompetência cósmica” do povo brasileiro, isto é, sua incapacidade de transformar a nossa injusta estrutura social e, ao mesmo tempo, a impaciência, o desejo enfim de uma mudança radical, que anima o prefácio em 1933.

Glauber Rocha não realizou nenhum filme baseado explicitamente na obra de Oswald de Andrade. O cineasta nunca filmou uma adaptação literária, entretanto, afinidades ideológicas e estéticas profundas o ligam ao antropófago de São Paulo. Por outro lado, em ambos há a assunção plena de uma forma artística experimental, verdadeiramente revolucionária. Se Oswald convulsionou a linguagem literária, expurgando dela o lado “bem comportado”, o mesmo se pode dizer a respeito da invenção cinematográfica de Glauber, que coloca em xeque a demanda de uma representação dita realista, sobre a qual busca uma identificação plena, com a realidade extrema. Ambos assumem que a linguagem, seja literária, seja cinematográfica, são discursos que, se por um lado buscam (re)apresentar a realidade, por outro lado, em grande medida a inventam conforme a perspectiva particular do autor, sua visão de mundo, em um momento historicamente determinado.

Enaltece, concluindo o seu artigo, incluindo uma referência a um dos mais importantes encontros entre Oswald de Andrade e o cinema: O Homem do Pau-Brasil, do diretor cinemanovista Joaquim Pedro de Andrade, produzido em 1981, o dedica ao seu amigo Glauber Rocha. De acordo com Pascoal Farinaccio, o filme é uma biografia livre inspirada na vida e obra de Oswald, com destaque para o que se encontra registrado em Serafim Ponte Grande e na autobiografia do autor, Um Homem sem Profissão: Sob as Ordens de Mamãe.


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